Nos conhecemos há muitos anos. Ele recém- chegado do Rio de Janeiro, nas assembleias dos professores da rede particular de Pernambuco. Acompanhado da mãe da sua filha que estava grávida na época, a primeira pernambucana que conquistou seu coração. Era seu segundo casamento. O primeiro também foi com uma nordestina do Rio Grande do Norte com quem viveu cinco anos no Rio de Janeiro.
Gostava como se colocava nas assembleias. Sempre votava com ele que era
ligado a um grupo de prestista (grupo que seguia a linha política que tinha como
referência as ideias do comunista Luiz Carlos Prestes), embora eu não
pertencesse a qualquer grupo político organizado.
Sua juventude foi vivida no Rio de Janeiro, em meio ao movimento mais ligado ao estilo hippie, alternativo. Mas antes disto, foi um boêmio. Tocava pandeiro e cavaquinho
e veio para Recife trazendo um violão debaixo do braço.
O relato que faz sobre a sua paixão pelo Recife é muito bonito. Diz que
quando chegou no pé da ponte Duarte Coelho, já na avenida Guararapes, uma das
principais do centro da cidade, olhou para a paisagem e abriu os braços
sentindo o vento bater no seu rosto e daí, não teve dúvidas, era ali que iria
viver o resto dos seus dias.
Não gosta, nunca gostou, quando digo que é carioca. Não porque rejeite o
lugar onde nasceu e viveu até 28 anos de idade. Mas porque se sente
pernambucano da gema e sempre diz ser natural de Casa Amarela, um dos bairros
periféricos mais populoso do Recife, berço de muitas histórias do movimento
social popular. Assumiu ser pernambucano nascido em Casa Amarela, tanto porque lá
morou, mas principalmente porque foi na maternidade deste bairro onde a sua
filha nasceu. É apaixonado pela cultura pernambucana e se confunde com ela nas
suas múltiplas formas de experimentá-la e de viver a sua própria vida.
Nossos filhos nasceram no mesmo ano, 1980. Um mês de diferença apenas
entre um e outra (janeiro e fevereiro).
Depois de nos separarmos dos nossos companheiros, pai e mãe dos nossos
filho e filha, vivemos outras histórias antes de nos encontrarmos e iniciar a
nossa relação afetiva, o que aconteceu no reveillon de 1988/1989.
Lembro de uma vez, muito antes de começarmos a namorar, eu já olhava
para ele com olhos libidinosos. Chamou-me para conversar. Eu segui toda
arrumada. Deu tudo errado, pelo menos para mim. Chegando ao local do encontro,
um bar muito simples na esquina da avenida Conde da Boa Vista com a rua das
Ninfas (primeira decepção), eu ainda desejando que ele me convidasse para um
lugar um pouco mais romântico, descobri que a sua intenção era conseguir o meu
voto para o grupo político dele, que era um dos que se candidatava à direção do
Sindicato. Que frustração. Nem sei se ele conseguiu ganhar meu voto naquele
dia. Só sei que eu não consegui ganhá-lo para mim.
Durante os anos de 1980 cursou o mestrado de História e fez concurso
para a Universidade Federal de Pernambuco para ser professor de História da
Educação. Voltamos a nos encontrar entre os anos de 1986/1987, quando ele
passou a prestar assessoria na formação dos especialistas em educação/formadores de professores, da Secretaria
de Educação do Recife, grupo do qual eu fazia parte. Depois nos encontramos
novamente no Centro de Educação da UPE, onde ele era professor. Eu fazia um Curso
de Especialização em Fundamentos da Educação e estava no momento da escolha de um/a orientador/a
para a produção da minha monografia. A pessoa que eu havia escolhido desistiu
horas antes do prazo determinado para a entrega dos nomes dos orientadores. Andava
pelos corredores do Centro, quando passei em uma sala onde ele dava aula. Chamei-o
na porta e perguntei se poderia ser meu orientador. Ele aceitou de imediato.
Era fim de ano e, a partir daí as coisas passaram a funcionar através de
trocas de bilhetinhos na porta da sua sala, para marcar conversas sobre o
trabalho.
Dias depois, já após o Natal, nos encontramos em uma rua do centro da
cidade e marcamos para nos encontrarmos no réveillon, nas ruas e ladeiras de
Olinda, após meia noite.
Chegado o último dia do ano, saio eu de casa toda arrumada, penteada,
com uma trança nos cabelos, toda cheia de gel e de biliros (como chamamos aqui
no Nordeste grampos de cabelo). Toda de branco, com um vestido de malha, saia
balonê (ou balone, ou balão) e com um blazer também branco que tinha uma cauda
na parte de trás como um fraque. Também calçava um par de meias finas branca e
uma sapatilha.
Nos encontramos nas ladeiras de Olinda, ele de camisa da CUT amarela e
com um short de chita. Sim, eu estou aqui rindo, como sempre acontece quando
conto essa história. Fomos para um bar, eu, ele e algumas amigas nossas.
Bebemos e conversamos até o dia raiar, então fomos para a beira mar ver
o sol nascer. Ali trocamos o nosso primeiro beijo. Sentamos na praia e ele
começou a tentar tirar os birilos do meu cabelo. De birilo em birilo, de amasso
em amasso, quando nos despedimos, os meus cabelos já estavam totalmente soltos
e as meias nas minhas mãos.
Começamos a namorar. Mas íamos viajar no mês de janeiro para lugares
diferentes. Fui para o Rio de Janeiro, onde tenho familiares, junto com uma
tropa: pai, mãe, filho, amiga, duas tias e uma amiga de uma das tias, de
ônibus. Ia passar o mês na casa do meu primo, em Niterói.
Ao retornar, logo no início de fevereiro acontecia o carnaval. Fomos
para o Galo da Madrugada, eu, algumas amigas e o filho do meu primo que veio
passar o carnaval no Recife.
Depois fomos para um outro bloco, o “Nós sofre mas nós goza”, que reunia
a maioria das pessoas da esquerda recifense e saía da Rua Sete de Setembro.
Sabia que ele estaria ali e que, com certeza, estaria me procurando também. Mas
não o encontrei logo na concentração onde também acontecia o desfile de fantasias
antes da saída do bloco. Então, para fazer de conta que não o estava
procurando, peguei nas mãos do meu primo e saí andando por entre as pessoas e o
avistei de longe. Ele, depois me disse, achava que eu estava acompanhada de um
novo namorado, mas nos aproximamos e ficamos assistindo ao desfile, eu na sua
frente e ele já com os braços circulando o meu corpo. De repente começamos a
nos beijar e daí em diante não paramos mais. Nos beijamos tanto nesse carnaval,
que uma amiga nossa dizia que a minha monografia estava sendo orientada ali e
até o fim do carnaval seria escrita.
Nunca havíamos casado oficialmente, mss já morando juntos, resolvemos escolher o carnaval
como uma das datas em que comemorávamos o nosso encontro. E, em um carnaval
qualquer, não lembro mais o ano, nos casamos em meio a folia, debaixo de
confetes e serpentinas, rodeados por amigos e pela multidão.
Um outro momento que passou a fazer parte da nossa história aconteceu no
Rio de Janeiro, na praia do Leme, quando a sua irmã, colocou as alianças do seu
pai e da sua mãe nos nossos dedos e nos abençoou como casal. Foi no ano de
2008, ano em que nossas mães, a minha e a deles, haviam falecido.
Chegamos em setembro de 2014, em pleno decorrer de 25 anos de parceria. Ele,
sem que eu soubesse, pegou uma carona no casamento do meu irmão, e, em combinação
com o mesmo e com a minha cunhada, chamou amigos mais próximos e que tinham
acompanhado a nossa história, trouxe a irmã e o cunhado, assim como o seu
melhor amigo do Rio de Janeiro e deixou alguns parentes, tanto os que viviam no
Rio quanto em outros lugares do Brasil, a par do que ia acontecer. Muitos só
ficaram sabendo que ali também seria realizado o nosso casamento oficial, durante
a cerimônia. Eu fui a última a saber.
Foi um momento de sustos, mas especialmente de muita emoção e beleza,
quando então declaramos e renovamos os nossos votos de amor.
Portanto, o que posso dizer deste homem, que está na minha vida há 26
anos?
Os primeiros anos de namoro, nós vivemos em casas separadas e tivemos
alguns atropelos como todo e qualquer casal. Passamos por muitas coisas juntos,
brigamos, gritamos um com o outro, tivemos dúvidas, ah! como tivemos, mas
especialmente nos apoiamos. Com ele aprendi a ser mais tolerante, a ser mais
solidária, mais companheira. Ele é uma pessoa repleta de qualidades e sempre
foi um excelente pai para a sua filha, porque ele sabe o significado puro da
palavra cuidar.
E ele cuida não apenas de nós, da sua filha, de mim, do meu filho, da
sua irmã, dos seus sobrinhos, dos seus cunhados e de todos os parentes (como
cuidava dos seus pais e dos meus), mas também cuida dos amigos. E cuida como
irmão, cuida como as pessoas merecem ser cuidadas. Tem um senso de
responsabilidade e solidariedade que sempre foi um dos aspectos de seu caráter
que me fez permanecer com a certeza de que queria continuar a ser a sua mulher durante
muitos e muitos anos. Ele tem sido o meu querido companheiro e muitas vezes me emociono
com o jeito espontâneo como ele cuida de mim. Tenho certeza que todos os seus
amigos e parentes sabem do que estou falando. Nós nos chamamos de pretinho e
pretinha, mutuamente. E eu ainda sou tremendamente apaixonada por este homem.
Feliz aniversário Geraldo Barroso, meu pretinho. Sei que o que aqui
escrevi não consegue dimensionar por completo as suas qualidades e o tamanho do
seu imenso coração. Eu amo você.
Dia 10 de junho de 2015,
Às 00:30 min.
Quarta-feira,
dia do seu aniversário.
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